sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

O Natal, a Bolsa e os tempos de paz

"The Kensingtons at Laventie" de Eric Kennington, 1915. Pintura exposta no Imperial War Museum em Londres. (Publicado originalmente no grupo da Suno no Facebook em 12 de dezembro de 2017.)
"The Kensingtons at Laventie" de Eric Kennington, 1915. Pintura exposta no Imperial War Museum em Londres.

As grandes guerras mundiais do século 20 são as maiores chagas do nosso tempo. Se elas foram responsáveis por grandes avanços tecnológicos, que depois resultaram em benefícios para a sociedade em tempos de paz, o custo em vidas humanas foi caro demais, causando danos perpétuos para os quais não há reparação.

Nada pode ser mais degradante do que ser obrigado a transitar por uma trincheira cavada na terra, que em dias de chuva se converte num canal de esgoto por onde correm os restos mortais de vítimas de um conflito irracional. Tiros de metralhadoras impedem a visão do campo de batalha. O medo se instala nos rostos de seus companheiros e estranhos rezam para não serem escolhidos para ocupar a linha de frente do combate.

A região fronteiriça da França com a Bélgica virou terra de ninguém em 1914 – ano da eclosão da Primeira Guerra Mundial. De um lado, ingleses e franceses tentavam conter os avanços do exército alemão, na direção oposta. Negociações diplomáticas que envolveram inclusive o Papa Bento XV mostraram-se infrutíferas. Tudo indicava que a noite de Natal seria passada sob a tensão das armas de fogo.

No entanto, um soldado alemão começou a entoar a canção “Noite Feliz”. Logo um coro de alemães o acompanhou. Ao fim da música o silêncio prenunciou algo inusitado. Os ingleses agradeceram a apresentação. Os comandantes dos regimentos sinalizaram um aperto de mãos.

Quando ficou claro que os tiros haviam cessado, alemães, ingleses franceses se aproximaram. Todos passaram o Natal juntos. Na falta de presentes enlaçados, eles trocaram barras de chocolate, fotografias de entes familiares, cartas de esposas esperançosas e goles de bebidas alcoólicas. No dia seguinte, jogaram uma partida de futebol, com 60 soldados de cada lado.

Generais ordenaram o recomeço da batalha, mas os tiros eram desperdiçados em direções neutras. Este episódio foi encenado, inclusive, num clipe musical de Paul McCartney em 1983, intitulado “Pipes of Peace”. Já em 2005 um filme inteiro foi rodado com este mote: "Joyeux Noel".

Os momentos de paz, no meio de uma sangrenta guerra, foram possíveis por causa do desejo sincero das pessoas em realizarem trocas voluntárias que, independente de crenças espirituais, são fortemente incentivadas na proximidade do Natal.

Neste ponto, certamente você já leu artigos sobre os excessos que ocorrem nas ceias de Natal. Criticam o fato de algumas famílias terem tanto para gastar com presentes e lembranças, ao passo que outros passam fome. Outros dizem que o verdadeiro espírito de Natal é deixado de lado em favor da comilança e do consumismo.

Isso é repetido nas escolas e nas redes sociais. Querem nos fazer sentir culpa pelo fato de que podemos nos reunir com parentes ou amigos para festejar. Quem nunca caiu nessa conversa?

Eu já caí. Até que tomei consciência de que o Natal é o período do ano mais esperado pelos lojistas. Muitas empresas saem do vermelho com as vendas natalinas. Mesmo em tempos de crises econômicas, as pessoas não deixam de comprar algo para seus entes queridos. Isso é bom!

Com a proximidade do Natal, empregos temporários são criados. Oportunidades surgem. Quantos funcionários temporários não se tornam funcionários fixos no comércio? Certamente você conhece alguém em situação parecida.

A origem do Natal é importante para quem acredita nela, mas inclusive os desprovidos de qualquer sentimento de fé podem se beneficiar das comemorações no fim do ano – período onde as pessoas mais realizam as trocas voluntárias que movimentam a economia como um todo.

O que isso tem a ver com a Bolsa de Valores?

Tudo.

No mercado de capitais, todo dia útil é como se fosse um dia de Natal, no qual não apenas pessoas, mas empresas de todo porte, fazem trocas voluntárias.

Você, como investidor, não é obrigado a comprar ações de qualquer empresa. Ninguém aponta uma pistola na sua cabeça e ordena: “Compre ações da Taesa!” – Se você compra ações da Taesa, o faz uma vez que esta é a sua vontade.

A Taesa também não é obrigada a pagar dividendos pomposos para você. Mas ela o faz não só perto do Natal, mas também perto do Carnaval, das Festas Juninas e do Dia das Crianças.

Trocas voluntárias. Se uma empresa não te deu nada em troca pelo fato de você ter dado valor para ela, então não fez sentido investir na mesma.

Depois do encerramento da Segunda Guerra Mundial, europeus e norte-americanos chegaram à conclusão de que viver em paz era mais inteligente. Eles fundaram a Organização das Nações Unidas – ONU – no mesmo ano. Num movimento semelhante, dois anos depois surgiu o Acordo Geral de Tarifas e Comércio, que em 1995 se converteu na Organização Mundial do Comércio – OMC.

Os objetivos da ONU e da OMC são promover a paz e o livre comércio entre as nações. Os dois conceitos são possíveis justamente por causa das trocas voluntárias. Portanto, se você investe através da Bolsa de Valores, você também investe na paz.

Exagero? De modo algum. Conforme Tiago Reis já escreveu, pergunte para os executivos da Apple, da Coca-Cola ou da Monsanto se eles desejam ver uma guerra entre Estados Unidos e China. Para os gestores do Facebook e do Google, uma nova guerra mundial travada na Europa teria graves consequências para seus negócios.

As atuais ameaças de guerras e as ações terroristas são praticadas principalmente por aqueles que bradam contra o livre comércio – o primo irmão da democracia. Se o mundo não está livre do terror e das guerras, ao menos os conflitos bélicos deixaram de ser incentivados em países onde a economia é baseada nas trocas voluntárias. Isto não significa que eles possam se desarmar. O que não deixa ser lamentável.

Ao menos no próximo Natal, você não precisa se sentir culpado por demonstrar afeto por alguém lhe presenteando, por exemplo, com uma blusa das Lojas Riachuelo, empresa sob o guarda-chuva da Guararapes, cujas ações estão entre as que mais se valorizaram desde o Plano Real.

Na Suno Research, os analistas não descansam nem no Natal, para que você tenha acesso a conteúdo relevante sobre investimentos de valor com foco no longo prazo. Que seja um longo prazo repleto de paz.

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