terça-feira, 30 de outubro de 2018

Bolsonaro: do Vêneto para Brasília

O mapa do Vêneto segundo o Google.

Jair Messias Bolsonaro foi eleito presidente da República. Os grandes veículos de comunicação, que antes o desprezavam (era apenas um deputado do baixo clero) passaram a tratá-lo como um representante da extrema-direita reacionário (quando ele começou a chamar a atenção do eleitor da classe média). Após a festa por sua vitória, depois de 57 milhões de votos, já se ocupam de contar sua história de vida em tom novelesco.

Sabemos que "Jair" é uma homenagem de seu pai ao craque Jair Rosa Pinto, o jogador mais raçudo que já vestiu a camisa do Palmeiras na década de 1950. O "Messias" fica por conta da mãe, católica fervorosa.

E "Bolsonaro"? Trata-se de um sobrenome italiano, cuja grafia original é "Bolzonaro". Como muitas famílias italianas que vieram para o Brasil a partir de 1870, os Bolsonaros (Bolzonari) vieram do Vêneto, uma região do norte da Itália cuja cidade mais conhecida é Veneza. No entorno de Padova ainda existem parentes italianos do novo presidente do Brasil.

Nunca vi Jair Bolsonaro na minha frente, mas tenho a impressão de que ele é meu conhecido. Talvez seja seu jeito simples de conversar, que lembra aquele tio do churrasco que impõe seus argumentos falando mais alto. Acredito que muitas pessoas estejam sentindo algo parecido. Vemos tanto Jair Bolsonaro na TV e na Internet que ele nos parece familiar.

Sou um Tosetto. Minha família paterna também veio do Vêneto (Noventa Vicentina), de modo que reconheço alguns traços da personalidade do capitão reformado em alguns de meus parentes. Ele tem um jeito meio desleixado, típico de italianos. Veja o cenário improvisado de seus vídeos caseiros: bandeira do Brasil fixada na parede com fita crepe, toalha estampada sobre a mesa com jarra plástica de suco comprada na feira. Jair Bolsonaro toma água de moringa enquanto xinga seus adversários da esquerda.

O quartel general dos carcamanos - termo preconceituoso alusivo aos italianos no sul do Brasil (foto: Facebook).
O quartel general dos carcamanos - termo preconceituoso alusivo aos italianos no sul do Brasil.

Essas improvisações são coisas de gente pão-dura. E os italianos são pão-duros, turrões e teimosos. Boa parte disso se explica pelo fato de um pai italiano querer o melhor para sua família. Os italianos economizam para não faltar comida no prato dos filhos. Mesmo quando deixam de ser pobres esse comportamento fica enraizado neles.

Mas os italianos tem também um senso de justiça muito próprio, determinação e vontade de fazer o que é certo, ao menos o que eles entendem que é o certo. Se um italiano coloca uma coisa na cabeça, ele vai até o fim, sem dar bola para a torcida.

Quando um italiano quer fazer o que é certo, então a improvisação fica de lado. A beleza e a perfeição se misturam num ideal a ser perseguido. Por isso, no meio do caos surgem as obras primas: vide a arquitetura de Florença, os carros de Turim, a moda de Milão, a história de Roma, a culinária de Nápoles.

O Brasil terá seu primeiro presidente com sobrenome italiano eleito democraticamente. Num país que recentemente tem discutido tanto a dívida cultural com índios e afrodescendentes, poucos falam da importância dos imigrantes italianos para o desenvolvimento do país. Não só dos italianos, mas também de todos os europeus, árabes e asiáticos. O Brasil é a Terra Prometida de muita gente.

Nunca um descendente de italianos ocupou um cargo tão importante antes no Brasil, num momento tão crucial. Esse é justamente o meu medo: que Bolsonaro nos decepcione. O italiano gosta de duvidar. Duvidar faz parte de seu jeito provocador. Um italiano incentiva o outro dizendo que tudo dará errado e que se der errado a bronca será homérica, fora a surra.

Sinceramente, acredito que o Brasil ainda passará por anos muito complicados. A situação ainda vai piorar antes de melhorar, em vários sentidos. Embora tenha votado no Bolsonaro por exclusão, não sou Bolsonarista. Vejo restrições quanto à sua capacidade de comandar o Poder Executivo de um país continental.

Se o Jair Bolsonaro que predominar for aquele desleixado e improvisador, estamos ferrados! Mas se for o Jair Bolsonaro determinado, que em quatro anos saiu do baixo clero da câmara dos deputados para ser eleito presidente, então temos alguma chance. Que ele possa perseguir a beleza e a perfeição e contaminar sua equipe de ministros e assessores com este ideal.

Embora tenha minhas dúvidas, jamais torcerei contra só para ter razão. Quero dar o braço a torcer. Se der certo, será bom para todos. Se der errado, nós saberemos cobrar.

Veja também:

2 comentários:

  1. Muito bom Jean, somos assim mesmo. E que Deus nos abençoe.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Alexandre, temos que fazer nossa parte também. Abraço!

      Excluir

O seu comentário construtivo será bem vindo. Não publicaremos ofensas pessoais ou dirigidas para qualquer entidade. EVITE ESCREVER SOMENTE COM MAIÚSCULAS. Não propague spam. Links e assuntos não relacionados ao tema da postagem serão recusados. Não use termos chulos ou linguagem pejorativa.