Mensagem de Alberto Costa, consultor empresarial, recebida em 19 de junho de 2017:
"Li, nesta tarde, seu post 'Qual é o valor justo de um projeto arquitetônico?'. Ocorreu-me que algo não estava muito claro em seu texto e levei algum tempo para perceber o que era. Daí, lembrei-me de algumas conversas que tive, há bastante tempo, a respeito do significado de valor, com [justamente] um engenheiro do valor, com quem convivi aqui por algum tempo (ele reside em Curitiba, agora).
Essas conversas giraram, então, em torno da ambiguidade com que a palavra valor é normalmente usada e de como isso prejudica a compreensão e o diálogo entre os profissionais de serviços (especialmente) e seus clientes. Com sua licença, portanto, vou fazer uma breve exposição ordenada da questão.
Na relação entre vendedores e compradores, o ponto de conexão se chama preço. Um negócio só é fechado quando ambos, vendedor e comprador, estão concordes quanto ao preço. E essa é, por incrível que pareça, a única concordância que se exige para fechar um negócio.
Há outras 2 variáveis em questão, entretanto: uma delas é o custo, variável só conhecida pelo vendedor e que ao comprador não importa, praticamente; a outra é o valor, variável só aquilatável pelo comprador e sobre a qual o vendedor não tem qualquer domínio.
Uma transação satisfatória ocorrerá sempre que o preço for suficiente, do ponto de vista do vendedor, para cobrir-lhe todo o custo de produção, de comercialização e de oportunidade e, do ponto de vista do comprador, ele for equivalente (pouco mais ou pouco menos) ao valor por ele atribuído ao produto ou serviço.
Quando dizemos que o preço de algo é barato, isso significa que lhe atribuímos um valor maior do que o que é expresso pelo preço. Quando dizemos que é caro, estamos afirmando que o preço é superior ao valor que percebemos no objeto sendo negociado.
É assim que vendedor e comprador podem ter percepções muito diferentes (e conflitantes) a respeito do preço de um produto/serviço: enquanto o vendedor está mentalmente comparando o preço com os seus custos, o comprador está fazendo o mesmo exercício mental, mas comparando o preço com o valor percebido no objeto da negociação.
Com algum esforço, eu consigo entender o que você escreveu em seu post; entretanto, o uso de valor como sinônimo de preço (algo muito comum em qualquer conversa, devo dizer), torna difícil entender o problema que você está acusando e, ainda mais, torna difícil pensar nas ações adequadas para solucioná-lo. Assim, embora seu texto seja suficiente para fazer seus leitores conscientes de que há um problema (aliás, é provável que eles já o soubessem), faz muito difícil para eles deduzirem como devem agir para eliminar o problema recorrentemente presente em suas negociações.
Como eu disse ali no assunto, pretendo que isso se torne uma conversa. Eu lhe sugeriria ler seu texto à luz do que eu escrevi (se é que eu fui suficientemente claro, o que não quero presumir)... Depois disso, eu gostaria de saber o que você acha disso: se não concorda, se concorda, se isso lhe traz problemas a resolver, se isso lhe traz alguma luz, suficiente ou não... Então, teremos uma conversa... O que acha?
Grande abraço e uma excelente semana."
Nossa resposta:
Há um frase icônica do megainvestidor americano Warren Buffett a respeito da noção de preço e valor:
“'O preço é o que você paga; o valor é o que você leva’. Falando de ações ou de meias, eu gosto de comprar mercadoria de qualidade quando está barato.”
Note que ele está associando preço a uma mercadoria. É algo que você paga e leva na hora. Quando você compra uma ação, paga um preço por ela, mas leva para sua carteira de investimento o valor de uma empresa que, via de regra, presta serviços de fabricação ou comercialização de algo.
Pessoalmente, também associo a palavra "preço" a um produto palpável. Quando vou ao supermercado, verifico o preço do quilo do feijão. Mas quando preciso cotar um serviço de manutenção preventiva no meu carro, eu avalio o valor da mão de obra cobrado pelo mecânico.
Num escritório de Arquitetura, o cliente pode até assinar um cheque à vista pelo projeto contratado logo na primeira entrevista, mas levará semanas para ele receber a encomenda. Não se trata de uma transação imediata, por isso trato do valor do projeto e não do preço do projeto.
Um empresário que "valoriza" o seu empregado, não pensa no salário dele em termos de preço, mas de valor. O custo do empregado está relacionado ao valor de sua hora trabalhada, não do preço de tal hora. Precificar um funcionário é desumanizá-lo.
Deste modo espero ter enriquecido nossa conversa.
O retorno:
"Na base da dificuldade de precificar serviços (comparada com a dificuldade de precificar produtos), está exatamente a falta de tangibilidade dos serviços.
Enquanto eu posso entrar na loja de calçados, calçar meia dúzia de pares, escolher os 2 pares que me calçam melhor e, então, pagar o preço que me foi pedido (ou pechinchar e conseguir um preço levemente menor, por estar levando 2 em vez de um), quando eu contrato um arquiteto, um advogado, um consultor, eu estou fazendo uma aposta - até que o serviço seja efetivamente prestado, eu não posso verificar se ele tem o valor presumido por mim quando concordei com o preço a ser pago. Assim, vender serviços demanda mais do que meramente atribuir valor ao serviço - o valor do serviço inclui, por ex., a reputação do prestador de serviços também (o que implica que não basta descrever o serviço - é preciso adquirir crédito, previamente, para a reputação do prestador).
No caso do trabalho, é importante, como você disse, não precificar a pessoa. O que está sendo comprado é o trabalho feito por ela. Um certo número de horas, o desempenho de uma relação de tarefas, alguns comportamentos, certos resultados: isso, sim, tem valor para o contratante. Por isso ele está disposto a pagar um certo preço, descrito como salário. Sem dúvida, é preciso ficar claro que o valor não está na pessoa, que não é comercializável, mas no trabalho e nos resultados que ela entrega. Quando o empregador percebe que o valor recebido, em forma de trabalho e seus resultados, não corresponde ao preço que ele paga, ele a demite (ou começa a reclamar). Quando é o empregado que percebe que o preço pago por seu trabalho é inferior ao custo que ele tem para prestá-lo, ele faz greve, demite-se ou, simplesmente, começa a reclamar.
Creio que estamos acordes nisto."
A conversa está em aberto.
Veja também:
Obrigado por dar ocasião a essa boa conversa, Jean. Esperemos que seja útil a seus (nossos) leitores. E que venha mais conversa... Grande abraço!
ResponderExcluirNo mínimo essa conversa vai continuar na manete de quem ler o texto, mesmo sem comentar. A nossa parte foi começa-la sem pretensão de por um ponto final na mesma. Abraço!
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