segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Condicionar a carreira aos ciclos olímpicos é uma cilada

O tempo corre constantemente. Ele não pula de quatro em quatro anos.
O tempo corre constantemente. Ele não pula de quatro em quatro anos.

Grandes eventos esportivos, como a Copa do Mundo de Futebol e as Olimpíadas, só acontecem de quatro em quatro anos. Através deles percebemos claramente que o tempo passa. No encerramento dos jogos olímpicos do Rio de Janeiro, o locutor se despede com a seguinte frase:

- Nos vemos em Tóquio, em 2020.

Carambolas. A primeira coisa que pensei a respeito foi: "Terei 44 anos em 2020". Por isso é comum que muitas pessoas sintam um espécie de ressaca psicológica sempre que tais acontecimentos se encerram. É preciso ajustar os ânimos à rotina novamente.

A beleza do esporte, quando disputado em torneios curtos e eliminatórios, está no fato de que nem sempre o melhor ganha. Quem não é favorito entra na disputa com menos pressão e, as vezes, pode surpreender quem está lá com a obrigação de vencer. O outro lado desta moeda é a crueldade.

No salto com vara masculino, por exemplo,o brasileiro Thiago Braz não era apontado como eventual medalhista, mas ele chegou à decisão contra o francês Renaud Lavillenie - este sim considerado um dos melhores do mundo. Já com a medalha de prata garantida, Thiago arriscou um salto inédito na sua carreira. Ao transpor a barreira de 6,03 m (recorde olímpico) ele jogou toda a pressão para Renauld, que registrou a marca de 5,98 m sem conseguir superar o adversário.

No entanto, no salto com vara feminino, muito se esperava da brasileira Fabiana Murer, campeã pan-americana e mundial da modalidade, que ia para sua terceira e última tentativa de ganhar uma medalha olímpica, que infelizmente não veio. Foram pelo menos 12 anos de dedicação total ao esporte, abrindo mão de uma vida normal que, no entanto, não foi suficiente para atingir o grande objetivo. Ela sabe que não terá outra oportunidade e terá que conviver com isso para sempre.

Pressão semelhante viveu o ginasta Diego Hypólito. Ao ganhar a medalha de prata no solo, o bi-campeão do mundo desabou em choro. Disse numa entrevista que, na sua primeira Olimpíada, ele caiu de bunda, quatro anos depois caiu de cara no chão e que agora caia de pé. Mas bastava estar resfriado no dia da prova e talvez o resultado seria outro. Seria uma grande injustiça.

Mas o esporte não é justo e condicionar o sucesso de uma carreira a uma medalha olímpica é uma forma muito arriscada de viver. Prefiro ver a vida como um campeonato de pontos corridos, onde temos que nos empenhar para ir bem em cada rodada e, deste modo, minimizar as surpresas desagradáveis,

Não é preciso ser atleta para cair na cilada dos ciclos olímpicos. Tem gente que condiciona a sua felicidade a passar num concurso público federal, estudando mais de oito horas diárias, por meses a fio, para o grande dia da prova. Quantas dessas pessoas ficam nervosas na hora "H" e erram questões aparentemente fáceis? Elas se prepararam com afinco, mas nem todas terão o resultado esperado.

Vejo casais de namorados que marcam a data do casamento e passam a viver quase dois anos em função de uma festa que vai durar, quando muito, cinco ou seis horas. Quando a lua de mel acaba, vem o vazio da monotonia, pois o casal se preparou para uma festa, e não para uma nova etapa da vida. Quantos casamentos pomposos resultam em divórcio em menos de quatro anos?

Creio que um estilo de vida mais saudável é aquele em que somos reconhecidos, por aqueles que nos cercam, por aquilo que fazemos de bem no dia-a-dia. Isso implica que devemos dar valor, também, aos pequenos feitos diários dos nossos familiares, amigos e colegas de trabalho. E deste modo, mesmo uma segunda-feira cinzenta, com cara de ressaca pós encerramento dos jogos olímpicos, poderá ter o sabor da vida plena.

2 comentários:

  1. Muito bom. Excelente reflexão. Eu também não gosto de avaliar as pessoas (sejam atletas, políticos, empresários, arquitetos, engenheiros...) por uma única conquista. Gosto do conceito de "conjunto da obra". É muito mais justo.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Creio que pior do que avaliar o próximo apenas por um evento chave, é cobrar a si próprio em função disto. Minha tática é não depositar grandes expectativas sobre metas grandiosas, e não esperar o mesmo dos demais.

      Excluir

O seu comentário construtivo será bem vindo. Não publicaremos ofensas pessoais ou dirigidas para qualquer entidade. EVITE ESCREVER SOMENTE COM MAIÚSCULAS. Não propague spam. Links e assuntos não relacionados ao tema da postagem serão recusados. Não use termos chulos ou linguagem pejorativa.