segunda-feira, 5 de março de 2018

Morte súbita e desespero no fundo de uma xícara

Vista superior de uma xícara com restos de comida sendo coletada por formigas (foto de arquivo).
Vista superior de uma xícara com restos de comida sendo coletada por formigas (foto de arquivo).

Mais uma tragédia ocorreu na cozinha da edificação onde nos primórdios havia apenas vegetação sobre o nosso formigueiro, há centenas de milhares de gerações, segundo revelam os historiadores. *

Um exército de formigas estava trabalhando na coleta de alimentos para a próxima estação de inverno, entusiasmadas pela mistura, depositada no fundo de uma xícara, de açúcar com restos de uma substância parecida com o café, embora cientistas afirmem se tratar de um pó sintético com as mesmas propriedades estimulantes.

"Estávamos garimpando a glicose numa laje de cerâmica quando subitamente um hominídeo de grande porte despejou água sobre todas nós" - revelou Salatiel à nossa reportagem.

É a segunda vez, em menos de uma semana, que Salatiel escapa com vida da ação de um hominídeo. A primeira vez foi quando uma hominídea de porte mediano depositou farelos de amido de milho na lata de lixo, de onde poucas formigas conseguem retornar ao formigueiro.

No caso da xícara, dezenas de formigas morreram afogadas na sequência de jatos de água, intercalados com varreduras de esponja encharcada com detergente - um produto que os hominídeos gostam de usar em abundância para neutralizar a adesão dos alimentos em seus utensílios.

As demais mortes não foram confirmadas, mas dezenas de formigas caíram na escura tubulação que conduz diretamente ao "inferno", como se referem as formigas presbíteras à caixa de gordura que inutiliza os restos de alimentos misturados com o mesmo detergente. Trata-se de uma grande catedral subterrânea, uma espécie de formigueiro construído por hominídeos, de onde raras formigas voltaram com vida para compor os poucos relatos de experiências aterrorizantes.

Perguntamos a Salatiel quais são seus projetos futuros, uma vez que a morte lhe acenou de perto em duas ocasiões seguidas:

"Amanhã cedinho retomo o trabalho. Não sei fazer outra coisa" - respondeu, resignada, nossa heroica formiga, pedindo licença para levar mais um grão de chocolate para o estoque do formigueiro.

As autoridades foram cobradas para desenvolver um sistema de alarme para evitar novas tragédias como esta. "Os hominídeos são imprevisíveis" - confidenciou um membro da assembleia federal que pediu para não ser identificado, em função das constantes ameaças que vem sofrendo da oposição. "Do mesmo jeito que desperdiçam comida, eles nos perseguem de tempos em tempos" - completou.

"Tudo que sabemos é que hominídeos de pequeno porte ainda sentem medo de nós. Talvez possamos explorar isso no longo prazo" - afirma Zorobabel, porta-voz do observatório astronômico nacional.

Enquanto soluções não surgem, a orientação para as formigas coletoras é para tomar o maior cuidado possível. Elas nunca sabem se voltarão para casa no final de mais um dia de labuta.

* Da redação de "O Formigueiro Diário"

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2 comentários:

  1. Tosetto, na versão surreal infantil. Tenho certeza de que a sua filha adora essas viagens. Eu achei deliciosa a "reportagem".

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    1. Iríamos publicar um livro sobre os ataques terroristas de alguns anos (séculos) atrás, quando todo o formigueiro foi inundado com água e veneno, mas ficaria comprido e pesado demais para ler.

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